Por Rodrigo Casarin
A variedade de cervejas no Brasil está cada vez maior. Principalmente nas grandes cidades, é possível achar uma enorme quantidade de rótulos dos mais diversos estilos. Frequentemente travestidas de cervejas especiais, artesanais, gourmets e afins, aqui trataremos estas maravilhas apenas como cervejas – o que realmente são, sem qualquer tipo de afetação.
Acompanhando esse momento cervejeiro, diversas editoras vêm colocando no mercado obras a respeito da nobre bebida. Uma das últimas a fazer isso foi a Senac, que lançou A mesa do mestre-cervejeiro – Descobrindo os prazeres das cervejas e comidas verdadeiras, escrito por Garret Oliver, o responsável pelo comando das panelas da cervejaria estadunidense Brooklyn, uma das mais renomadas do mundo.
Como o próprio nome já explicita, o calhamaço com quase 550 páginas trata da combinação entre boas cervejas e boas comidas, casamento conhecido como zitoharmonização, mas é muito mais do que isso.
Antes de se transformar em um dos cervejeiros mais renomados do mundo, Oliver se formou em cinema. Com certeza na faculdade ele adquiriu uma maior sensibilidade para a arte. Talvez também tenha sido por lá que tenha desenvolvido um pouco seu talento para a escrita. Mesmo quando deixa as preocupações de ser técnico e didático de lado, o texto de Oliver flui muito bem. Os melhores momentos do livro são quando conta suas próprias histórias com as cervejas e cervejarias. Talvez, se tivesse explorado mais este lado intimista, poderia ter transformado o texto em um bom ensaio pessoal, o que transformaria A mesa do mestre-cervejeiro em um livro interessante para quem está além dos meios cervejeiro ou gastronômico.
A obra também traz alguns dos que parecem se estabelecer como paradigmas do setor. Chamar a boa e competente Cilene Saorin para prefaciá-la é de uma obviedade enorme. Nenhum problema com Cilene, mas o meio cervejeiro nacional já conta com diversos nomes tão capacitados quanto ela para assinar um prefácio. Também não há como não considerar um grande exagero falar que uma cerveja possui sabor de lã úmida. Além disso, a insistência demasiadamente grande na comparação entre a cerveja e vinho, como se a primeira só pudesse ter sua importância se superasse a segunda em quase tudo, chega a irritar. Por fim, o preço, que parece ser o grande empecilho para o definitivo estouro dos mais variados estilos da bebida no Brasil, é outro problema do livro: uma obra de R$ 99,90 parece decididamente focar nos mais abonados, contribuindo para que continue havendo uma elitização do setor.
Contudo, apesar do preço elevado, A mesa do mestre-cervejeiro é, junto com Larousse da cerveja, de Ronaldo Morado, o que há de melhor sobre o assunto no país, uma obra fundamental para quem quer se aprofundar no assunto. Oliver não se limita apenas à combinação de cerveja e comida, resgata muito da história da bebida, de seus estilos, dos métodos de produção e hábitos cervejeiros. Como se não bastasse (e não bastaria, na verdade), tem o grande mérito de entregar ao leitor um texto legítimo, não um apanhado de informações e verdade absolutas. Apesar de contar com um quadro de harmonizações para consulta rápida, quem quiser realmente aprender com a obra terá que realmente lê-la e, ao fazer isso, muito provavelmente também se divertirá. Mesmo em um livro de essência técnica, um bom texto faz toda a diferença. Aliás, um bom texto faz toda a diferença, sempre.
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