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Posts Tagged ‘Futebol’

Rodrigo Casarin

Wellinton_Melo_estrangeiro_labirtinto_167-140x214Há diversas formas de ser derrotado.

No futebol convencional, aquele que passa na televisão, as variáveis não são tantas. Há a derrota comum (1 x 0 ou 2 x 1 para o adversário), as goleadas (a partir de três gols de diferença, exceto em clássicos, quando qualquer derrota — às vezes até o empate — soa como uma goleada) e a derrota doída, aquelas com virada após os 40 minutos do segundo tempo ou em partidas decisivas. Há ainda detalhes como perder jogando bem ou sem sequer ver a bola que apenas dão alguma complexidade ao fracasso.

No futebol de rua — ou de quadra, ou society, ou qualquer futebol jogado com os amigos — as variações de derrota vão além das já citadas. No tradicionalíssimo dez minutos ou dois gols, ver seu goleiro ser repetidamente vazado em menos de um minuto é deprimente, principalmente se o jogo seguinte correr ao longo de seu tempo máximo enquanto você espera apaticamente sentado na mureta. Se forem quatro times na quadra, então, o vexame se torna ainda maior — ele é sempre proporcional ao tempo de espera. Há ainda a derrota não-derrota. É simples: a vantagem do empate é do time que já está na quadra. Não importa que o desafiante sustente bravamente ao longo de dez minutos o placar em branco, aquele que já estava ganhando que continuará em campo e os guardiões da defesa suíça voltarão para o banquinho, derrotados sem perder.

Na literatura também há diversas formas de derrotas. Às vezes, os livros são derrotados, às vezes, os leitores. Se pegarmos para ler uma obra e a largamos antes da página 50 ou de completar 10% do calhamaço, derrota vexaminosa para o livro. Se lemos uma obra inteira para no final dizer “é uma porcaria”, derrota normal para o livro. Livro lido, entendido e leitor satisfeito é empate. Se estamos encantados com o livro, mas não conseguimos avançar em suas páginas por conta de uma clara debilidade nossa, 1 x 0 pro livro. Agora, se adoramos o que estamos lendo, criamos expectativa para continuar a leitura e chegamos ao final com a impressão de que tudo aquilo valeu a pena, mas que ainda há muito para se entender da obra, aí é goleada para o livro. Diferentemente do futebol, onde muitas vezes o técnico não pode ser execrado ou vangloriado pelo resultado de uma partida, quando o livro perde, empata, ganha ou goleia, seu escritor é sim diretamente responsável por aquilo e merece ficar com todos os louros — ou receber todas as vaias.

Já havia perdido para alguns livros. Ulysses, de James Joyce, me desbancou por volta da página 300, Cem anos de solidão, de Gabriel García Márquez, já me derrotou por três vezes (nas três eu ainda era bastante jovem, então anseio por mais uma revanche). Já sofri algumas derrotas mais feias (um 5 x 2, talvez) para obras de Proust e Dostoiévski, por exemplo. Agora, uma goleada como a que tomei de Estrangeiro na labirinto, de Wellington de Melo, jamais havia tomado. Futebol envolvente, insinuante, com jogadores de características completamente versáteis, um olhar crítico sobre a própria maneira de jogar, domínio tanto do espaço quanto do tempo dentro de campo, atletas com fôlego para ir até a linha de fundo, voltar, ir de novo, dribles improváveis e inesperados… Eu também estava em campo e jamais me entregaria. Tentei jogar. Quando houve espaço, fui pra cima, mas o contra-ataque era sempre mortal. Fiz o que pude, mas, ao final, bastava-me bater palmas e admirar aquele que me derrotou. Não lembro exatamente como ficou o placar, mas era algo clássico, típico da copa de 1954, como um 7 x 3 ou 8 x 4.

As impressões do derrotado

Na quarta capa do livro, dicas que a partida seria difícil: “Um juiz acusado de homofobia ao julgar um assassinato, mas que esconde um segredo ainda mais sombrio. Um matador de aluguel que volta à casa dos pais para acertar as contas com o passado. Uma prostituta viciada em crack que se vê presa em um labirinto de palavras” — até aí tudo bem, o time parece ser bom, mas dá pra encarar — “Vozes anônimas que tentam explicar a natureza de um livro que supostamente aprisiona seus leitores, usando conceitos de física quântica, da psicanálise e do ocultismo” — com essa filosofia de jogos é que as coisas se tornam mais difíceis para qualquer adversário.

Estrangeiro no labirinto é um livro múltiplo — palavra ideal para acompanhá-lo, aliás. São histórias diferentes, contadas por narradores (cronistas) diferentes, com vozes completamente distintas e bem caracterizadas, que se alternam e, de alguma maneira, compõem a própria história do livro. Cada trecho está dentro de uma porta que pertence a um salão e é precedido por cartas de tarô. Alguns cronistas narram as histórias anunciadas na quarta capa, outros filosofam, discutem, censuram-se.

Por todas as partes, dicas e evidências da multiplicidade dos personagens. O recurso do duplo é amplamente explorado por Melo, e, em muitos momentos, remete às diversas possibilidades de se ver uma só existência, algo tratado magistralmente pelo italiano Luigi Pirandello em Cem, nenhum e cem mil. A habilidade em lidar com esse jogo, arrisco dizer, deixaria Borges e Gógol orgulhosos do trabalho do autor.

Sim, Estrangeiro no labirinto é um labirinto, só que não um labirinto moderno e bonitinho, cheio de arbustos bem aparados e turistas sorridentes, mas daqueles com espelhos que nos refletem, distorcem e confundem, daqueles mitológicos, repletos de armadilhas e charadas a serem desvendadas, daqueles que uma vez dentro, a possibilidade de sair é quase inexistente — sim, porque as páginas do livro acabam, mas ele continua na cabeça.

Que venham mais leituras da obra, diversas outras, para que os elementos comecem a ser realmente percebidos, entendidos e, a partir disso, explicados e debatidos. Creio que Estrangeiro no labirinto terá uma carreira de glória pela frente, que será daqueles times com poucos torcedores, mas extremamente leais e qualificados. Parabéns pela vitória, Wellington. Sento na mureta e espero minha vez de lhe desafiar novamente.

Texto publicado originalmente na edição 167 do jornal literário Rascunho.

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Por Rodrigo Casarin

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Sou são paulino e apaixonado por futebol. Antes do preço dos ingressos me afastar da arquibancada, ia praticamente toda semana ao Morumbi, e às vezes até viajava para torcer. Como também sempre gostei muito de ler, natural que tenha um enorme interesse por livros sobre futebol e torcidas.

Em uma conversa, descobri que precisava ler Entre os vândalos, de Bill Buford, jornalista que viveu como autêntico hooligan do Manchester United e depois transformou sua experiência em livro-reportagem. Torcedor eu já era, e havia decidido cursar jornalismo. Claro que fiquei empolgado. Queria a obra imediatamente, mas mal sabia o quanto demoraria para consegui-la.

Comecei a busca quando estava no primeiro ou segundo colegial. Frustrei-me, estava esgotado. Seria exagero dizer que visitei quase todos os sebos de São Paulo, mas com certeza entrei em todos pelos que passei em frente: ninguém tinha o maldito livro. De tempos em tempos, mandava e-mail para a Companhia das Letras. Minha esperança não era que republicassem Entre os vândalos apenas por minha causa, mas que achassem um mísero exemplar perdido na editora. Não rolou.

Foi no segundo ou terceiro ano da faculdade que descobri o Estante Virtual. Finalmente uma nova chance se abria. Pelo que tinham me dito, seria impossível não achar alguma obra no site. Mentira, já não achei algumas, mas felizmente três exemplares de Entre os vândalos estavam à venda. Comprei de um sebo em Bauru, era o que estava mais próximo de São Paulo. Virou o meu livro de estimação.

Alguns anos depois, finalmente a Companhia das Letras republicou a obra. Confesso que até hoje, sempre que esbarro com algum exemplar na livraria, tenho vontade de comprá-lo. É estranho vê-lo ali, fácil, à disposição.

2.

Estávamos reunidos em umas dez pessoas. Discutíamos particularidades e rumos de um dos livros que estou escrevendo. O lugar era uma mistura de sala de estar e biblioteca. Logo interrompemos o papo para almoçar.

Nosso anfitrião é um grande colecionador. Dentre suas coleções, a de livros é uma das proeminentes. Enquanto pessoas se serviam de quiches e copos de água, aproveitei para dar uma olhada nos exemplares que estavam enfileirados nas prateleiras. Pouca coisa me chamou a atenção.

Sentamos, almoçamos, falamos amenidades e partimos para o café e a sobremesa. Ficamos todos de pé, rodando pelo espaço. Voltei às prateleiras e, enfim, um volume realmente me atraiu. Aliás, não só a mim, mas aos que me acompanhavam também. Indiscutivelmente, tínhamos ali uma preciosidade que nos maravilhava. Logo o anfitrião puxou uma mesa embutida à estante, pegou o livro e cuidadosamente abriu para que nós o admirássemos. Não tinha nome, mas o importante era sua data: 1492.

Ao vê-lo, fiquei momentaneamente paralisado, mas poderia jamais ter outra chance de me relacionar com um Matusalém daqueles. Abdiquei da compostura que a reunião pedia. Só ver o livro não bastava. Toquei, peguei, acariciei e, finalmente, levantei o livro e meti o nariz o mais próximo possível das suas páginas — precisava saber quais cheiros trazia do século 15.

Não senti grandes coisas, mas ao menos não espirrei.

Saí de lá surpreso: como uma raridade daquelas estava ali, sem proteção alguma, à mercê de uma xícara de café voadora ou de uma colher que erre a boca e derrube pavê sobre suas centenárias páginas?

3.

Sempre precisamos organizar minimamente nossos livros. Na parte de cima da minha estante ficam as obras, digamos, técnicas. Um pouco abaixo estão as de não-ficção. Já mais perto do chão, ficção, e, na mais baixa das prateleiras, livros sobre futebol — não o Entre os vândalos, que está em não-ficção —, música, livros que escrevi, enfim, um apanhado de tudo o que sobrou.

Dentro de cada uma dessas seções, eles são separados novamente de acordo com o seu gênero específico e dispostos conforme o sobrenome dos autores. Tudo isso na teoria, claro, pois na prática pouco funciona. Raramente um livro retirado da estante volta para o seu lugar de origem. Logo os espaços acabam e precisamos abrir concessões. Se não cabe mais nada na parte de biografias, é mais fácil deixar a vida de Borges provisoriamente perto de um Dostoiévski do que remanejar todas as obras até que ache algum espaço mais adequado.

Também há muitos livros que são difíceis de classificar. Onde colocar o último de David Foster Wallace (que precisei tirar da estante e já não voltará mais para o seu lugar)? Apesar da capa dizer que se trata de um livro de ensaios, a classificação não me convence. Ficando longe do fato de já estar meio que longe de tudo é muito mais um apanhado de experiências jornalísticas de DFW. E Nu, de botas, do Antonio Prata? São memórias de sua infância, mas, pela forma e pelo autor, estou propenso a colocá-lo junto de obras ficcionais, não próximo de O ano do pensamento mágico. A plena e satisfatória organização de uma estante ou de uma biblioteca é uma utopia. Gosto de utopias.

4.

Não costumo falar de mim em resenhas — se é que deste texto está saindo uma resenha —, deixo isso para quem sabe fazê-lo com maestria, como o Julián Ana (que, aliás, anda um tanto sumido aqui do Rascunho. Espero que volte logo.), mas é impossível ler Fantasmas na biblioteca — A arte de viver entre livros, do bibliófilo Jacques Bonnet, e não pensar nos momentos mais marcantes e na relação que tenho com os livros.

O livro é um ensaio — com certeza irá para esta seção — que traz diversas nuances da relação do seu autor com as obras que compõem sua vasta biblioteca. Fala da busca por exemplares raros, da estrutura requerida para abrigar tantos volumes, da necessidade de classificá-los, das formas de ler (aqui concordo plenamente com o autor, o ideal realmente é estar alongado, como se a posição permitisse ao texto descer melhor pelo corpo)… Em alguns momentos, Bonnet traz um humor sutil e uma ironia que me lembraram Vanessa Barbara — que, aliás, tem diversos textos também falando da sua relação com os livros.

Aparentemente, Fantasmas na biblioteca é despretensioso, e esse é um dos seus grandes méritos. Não é preciso ser um grande livro para ser uma obra preciosa, daquelas que se preocupam apenas com o prazer da leitura, justamente para aqueles que amam os livros. É sempre bom ver algo que amamos sendo tratado com o carinho que Bonnet aparenta tratar seus livros e as histórias que estão ao redor deles. É sempre bom quando algo nos faz lembrar vivamente das nossas próprias histórias.

Texto publicado originalmente na edição 164 do jornal literário Rascunho.

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Crédito da foto: Renato Parada

Crédito da foto: Renato Parada

Antonio Prata está em evidência. Na mesma semana do lançamento do seu novo livro, Nu, de botas, no início deste mês, envolveu-se em uma polêmica por conta do texto “Guinada à direita“, publicado na Folha de São Paulo, jornal onde é colunista. Alguns não entenderam sua suposta mudança de posição ideológica, e outros, pior, aplaudiram de pé o texto que precisou ser esmiuçado no domingo seguinte para que maus entendidos (ou entendedores?) fossem resolvidos. Autor de obras como Douglas, As pernas da tia Corália, Adulterado, Felizes quase sempre e Meio intelectual, meio de esquerda, foi um dos integrantes da edição da revista Granta com os melhores jovens escritores brasileiros e ajudou a escrever a novela Avenida Brasil. Além disso, informação importante, fabrica cervejas em sua própria casa. Falou de todos esses assuntos nesta entrevista que fizemos com ele (e de futebol também!).

Canto dos Livros: Como anda a vida depois da guinada à direita?

Antonio Prata: Muito mais tranquila. É bem mais fácil ser de extrema direita do que ser meio de esquerda. Você não precisa se preocupar com a pobreza – é culpa dos pobres – nem com a desigualdade – cada indivíduo é diferente do outro. Você pode fazer piadas racistas, machistas e homofóbicas e pagar de vanguardista. Ser de esquerda dá muito trabalho. Você está sempre sofrendo. Direita é paz de espírito. (RISOS – é sempre bom frisar…)

CdL: Ficou muito surpreso com a reação das pessoas a esse seu texto? Pensou que haveria tanta gente se identificando com o discurso e incapaz de perceber a ironia?

AP: Fiquei. Eu escrevi tantos absurdos no texto que jamais pensei que alguém pudesse levá-lo ao pé da letra.  Afirmava que José Maria Marin e Marco Feliciano eram de esquerda, que o “poderoso lobby dos antropólogos” havia transformado toda a área cultivável do Brasil em reserva indígena, que os negros estavam no poder, escanteando os brancos…

CdL: Na quarta capa de Nu, de botas está escrito que no livro “Antonio Prata revisita as passagens mais marcantes de sua infância”. Nessas revisitas você foi fiel à sua memória ou você criou histórias – ou detalhes – em cima daquilo que lembra da sua infância? Você realmente deixou de ganhar uma bicicleta do Bozo porque não sabia qual era o seu endereço?

AP: Olha, não dá pra chamar memórias de outra coisa senão de ficção, esse é um primeiro ponto. A memória é sempre uma história editada, reescrita no nosso cérebro. Às vezes (não poucas) é até inventada do zero. Memórias tão antigas, então… Eu não poria a mão no fogo por nada do que está no livro, se tivesse que testemunhar num tribunal quanto à veracidade. Ou seja, mesmo o que eu acho que aconteceu, não sei se aconteceu mesmo (ou se foi do jeito que lembro). Já certas histórias ou pedaços delas eu realmente inventei, para melhorar os enredos ou preencher brechas. A história da bicicleta eu trago na lembrança exatamente do jeito que escrevi. (Mas duvido que tenha acontecido: você acha que o Bozo ia conversar com um moleque de 5 anos depois do programa? E que ia se propor a dar uma bicicleta, do nada? Estranho.)

CdL: Como foi escrever esse livro?

AP: Foi legal. E cansativo, como sempre é a escrita.

CdL: É raro vermos crianças sendo bem retratadas na literatura e em Nu, de botas, você consegue captar bem o contraste entre a diferença de olhar, raciocínio e pensamento entre uma criança e um adulto. Como conseguiu isso? Tentativa e erro, estudos sobre a infância, convivência com crianças, boa memória dos primeiros anos de vida?

AP: Agradeço o elogio. Eu tentei criar as histórias a partir das memórias. E as memórias já tinham uma certa linguagem, um certo estilo de narrativa. O que tentei fazer foi ser fiel a esse estilo. Agora, se é assim que uma criança pensa (ou que eu pensava), já não sei. Mesmo esse elogio é o elogio de um adulto, alguém que, como eu, já não sabe mais o que passa pela cabeça das crianças. É igual filme de época. Você assiste Gladiador ou Spartacus e diz “nossa, eles recriaram direitinho a vida em Roma!”: mas quem é que sabe como era exatamente a vida em Roma?!

CdL: Ainda sobre a técnica de narrar histórias sob a perspectiva de uma criança, é uma questão da habilidade de bons escritores (como Bill Waterson e Neil Gaiman, para ficar em dois exemplos), ou há algum macete que facilite a tarefa?

AP: Pois então, são recriações, né? Pra começar, se eu quisesse ser realmente fiel ao pensamento das crianças, teria que restringir meu vocabulário a duzentas palavras, não poderia fazer frases longas nem conjugar direito os verbos. Eu tentei esse caminho quando comecei a escrever o livro, ficou ridículo. Experimentei alguns caminhos antes de chegar no que está publicado.

CdL: O Nu, de botas foi lançado junto com o Ligue os pontos, do Gregório Duvivier, em uma espécie de balada. De onde surgiu essa ideia? Como foi a experiência de aproximar dois universos tão distintos, a balada e a literatura?

 AP: A ideia foi da editora e eu achei ótima, porque sou fã do Gregório (embora não o conhecesse pessoalmente). Mais do que pela balada, o lançamento foi legal porque teve um bate-papo entre o Gregório e eu e leitura de trechos dos livros. Quanto à balada, propriamente, lamento dizer que eu tava tão exausto depois de tudo que nem consegui chegar à pista de dança. (Subir num palco e falar em público não é muito aterrorizante, pra mim. Aterrorizante são os sete dias e as vinte e quatro horas antes de subir no palco e falar em público…).

CdL: Você começou a publicar seus textos em veículos de comunicação bem jovem. De lá até hoje, como tem acompanhado as mudanças na imprensa? Como enxerga o futuro dela?

AP: Cara, quem souber responder essa pergunta ou é um gênio ou tá mentindo… 

CdL: Avenida Brasil foi uma das novelas mais elogiadas dos últimos anos, principalmente por causa de seu roteiro. Como foi fazer parte da equipe que escreveu essa novela? Como o trabalho era dividido? Quais eram as suas funções?

AP: A história é criada pelo autor principal, João Emanuel Carneiro. Todo dia ele faz uma escaleta, um resumão bem detalhado do capítulo e manda pros quatro colaboradores. Na escaleta, já vem apontado qual colaborador pegará quais cenas. A gente faz basicamente diálogos. Daí manda pra ele, ele dá um tapa final e manda pra ser filmado.

Foi demais participar dessa novela, por várias razões. Primeiro, por trabalhar com o João Emanuel, um escritor talentosíssimo e generoso, com quem aprendi muito. Também pela graça de escrever um troço que metade do país tá assistindo e comentando. Sem falar na alegria que é ver o diálogo que você escreveu sair da boca de alguns dos melhores atores do Brasil. (Em vários casos, aliás, melhorado por eles).

CdL: Ainda sobre a novela, você teve alguma participação nas hilárias cenas que o Tufão aparecia lendo A interpretação dos sonhos, de Freud (e o chamava de Fred), Mar morto, do Jorge Amado (para o Leleco dizer que nem sabia que o mar tinha vida para morrer) e O idiota, do Dostoievski (para o mesmo Leleco dizer que idiota mesmo era o Tufão)? Como foi a recepção para essas, digamos, intervenções? Como o pessoal da Globo as recebeu?

AP: Olha, quem mandava nas leituras do Tufão era o João Emanuel.

Não vejo essas citações como intervenções. Fazia sentido a Nina incentivar o Tufão a ler, como parte da “recuperação” que ela estava promovendo ali. E havia algumas piscadelas pro público, também. O primeiro livro que ela deu pra ele, se não em engano, era o Primo Basílio, que tinha não só o tema da traição como a inversão de papéis entre patroa e empregada, que se daria entre Nina e Carminha lá pelo capítulo cem. 

CdL: Seu pai, Mário Prata, o influencia como escritor?  Há ou houve alguma cobrança – sua, dele, da crítica ou dos leitores – pelo parentesco? Houve algum conflito íntimo quando você decidiu que seria escritor, como querer se diferenciar do estilo dele? 

 AP: Eu sempre digo que influência é uma palavra leve demais para definir o quanto a presença de um pai determina os caminhos de um filho. Mais do que me influenciar, ele me deu vinte e três cromossomos, me ensinou a andar, a falar, etc. Ou seja: sem dúvida “influenciou” muitíssimo minha escolha na profissão.

No começo havia a desconfiança de algumas pessoas, sim, mas com o tempo isso ficou pra trás. Ser filho de um escritor sem dúvida me abriu muito mais portas do que criou cobranças.

Não acho que eu tenha querido me diferenciar do estilo dele. Nossas disputas edípicas se deram em outros campos que não nas páginas

CdL: Como parte do time, o que você tem a dizer sobre o vexame brasileiro em Frankfurt? Perder de 9X1 não foi um pouco demais?

AP: Cara, pegue dezesseis escritores brasileiros que treinaram juntos duas vezes na vida no Playball da Barra Funda (nunca os onze do mesmo lado, só seis contra seis) e ponha pra jogar contra um time de quarenta alemães que treinam desde 2005. Ponha num campo oficial, a quatro graus, com garoa fina. Acho que 9X1 foi praticamente um empate.

CdL: Você também faz cerveja em casa. Há alguma forma de se relacionar a literatura com a cerveja caseira?

AP: Os textos dá pra consertar o tempo todo, dá pra mexer, remexer, cortar, remendar. Cerveja, se você cometer um errinho, vai tudo pro lixo. Ou melhor, pra pia.

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Nascido nos Estados Unidos, o jornalista e escritor Bill Bufford mudou para a Inglaterra no final da década de 1980. No país bretão, ficou intrigado com o comportamento dos hooligans. A fim de  conhecer mais sobre aqueles grupos de homens que iam para partidas de futebol aparentemente apenas para brigar, o norte-americano resolve imergir nesse universo.

Depois de frequentar muitas partidas na Inglaterra e em outros países europeus acompanhando algumas torcidas inglesas e pesquisar muito sobre o assunto, Bufford escreve Entre os vândalos, um livro-reportagem que figura entre os melhores que existem sobre o assunto. Nele, fica explicito que uma das coisas que chama atenção do jornalista ao longo de suas andanças é a quantidade absurda de cerveja que os torcedores bebem.

Um dos méritos de Bufford ao escrever a obre foi colocar a marca que os hooligans mais consumiam: a irlandesa Harp. Irmã loira e menos famosa da Guinness, uma deliciosa negra (mas um tanto sem gás, é verdade) que a maior parte do mundo conhece e já provou, a Harp é uma Premium American Lager metida a Pilsen (como a maior parte das cervejas do seu estilo). Apesar de ser menos do que pensa que é, ainda assim é uma boa cerveja, que compete diretamente pela preferência de hordas de jovens com a loira holandesa Heineken.

Leve e refrescante, como manda o figurino das cervejas feitas para o povão, a Harp é realmente uma boa pedida para ser tomada em doses cavalares, de preferência assistindo a um São Paulo X Palmeiras, Grêmio X Inter, Flamengo X Fluminense, Atlético X Cruzeiro… Ou lendo um livro como Entre os vândalos.

Ah, só para não deixar passar, de vez em quando as irmãs se juntam e fazem um bacanal, conhecido como Half & Half. Veja aí:

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